Entra pela porta da sala.
Aparece ao menos uma vez ao dia. Almoça ou janta ou café
e pão com manteiga.
É um dos poucos lugares onde ainda se espreguiça.
“Boa tarde”.
“Boa tarde”.
O diálogo acontece na cozinha. Já é hora do chá.
“Tem café pronto, fresquinho”.
Ele repara as panelas no fogão, as frutas na mesa,
deve haver suco na geladeira.
“Ficou sem comer até agora? ”.
“Não. Eu comi uma coisinha por aí”.
“Veio uma moça, logo cedo, deixou uma criança comigo,
pediu que eu te entregasse. Ela disse ser seu filho”.
“Que moça? Que filho? ”.
“Não sei. Ela tinha o rosto coberto. Pude apenas ouvir
sua voz e ver suas mãos delicadas. Tinha um lindo anel no dedo. Uma moça.
Deixei a criança em seu quarto”.
“Como era a voz? ”.
“Eu não sei dizer”.
Lembrou da moça das Minas Gerais.
“Eu não posso ter filhos”.
Uma criança atrapalharia o promissor futuro todo
pensado por ela.
Ele pegou uma banana no balcão, saiu pela porta da
cozinha, abriu a porta de incêndio onde no vão entre a porta e a escada,
construiu dois cômodos, sua casa.
Entrou no
apertado primeiro cômodo. A curiosidade foi quem primeiro viu o bebê. Estava
enrolado em cobertores azuis, na cama, no cômodo seguinte.
Encostou a
porta que divide os dois cômodos, sentou no banquinho do cômodo um. Ainda podia
ver os olhos fechados do bebê dormindo. A criança nunca tinha visto a figura de
seu pai, nunca havia visto a fisionomia dele. Melhor que continuasse sem ver. Pensou
como faria isso. Pensou para quem entregaria a criança.
A criança começou
a chorar. Ele notou que ela estava na beirada da cama, mexia as pernas e os
pequenos bracinhos. De tanto mexer caiu no chão.
Ele colocou
a criança em seu colo e nesse momento o coração dele ardeu em chamas. Mas a
criança chorava e o choro dizia palavras que ele odiava, que o deixavam
completamente irritado.
“Fraco,
fraco, fraco, fraco”.
Como seria
possível um pai sem uma mulher?