- Guarda o
celular.
“ Amendoim! ”, “ Amendoim! ”, “ Amendoim!
”.
Não tenho certeza
se trato disso ou sigo.
Um homem negro
aparenta quarenta e sete anos ou mais, talvez, tenha menos.
“ Amendoim! ”, “ Amendoim! ”, “ Amendoim!
”.
Dia um. Possível
relacionamento. Oito da noite. Estão, dentro de um carro, dois personagens,
passeiam. O condutor obediente na indicação – LUZ VERMELHA – do semáforo, para o
veículo.
“ Amendoim! ”, “ Amendoim! ”, “ Amendoim! ”.
- E aí, brow, vai levar? – Fala do trabalhador –
personagem vendedor de amendoim torrado. O trabalhador aproxima-se do veículo com
intimidade.
- E aí, beleza? – Fala
do condutor. O condutor abaixa por completo o vidro lado esquerdo, lado do motorista
do veículo.
- Ahh! Olha só! Tá acompanhado. Vai levar?
- Tá afim? – O condutor dirige a fala ao
passageiro. O passageiro não pronuncia palavras. O passageiro força os lábios,
os olhos, o rosto, o sorriso. Faz que não com a cabeça.
- Não, hoje não. –
Fala do condutor para o trabalhador.
- Tá certo. Ó lá, brow, abriu!
- Valeu!
- Falou! Vão com Deus.
- Valeu. – O
veículo parte.
Dia dois.
Confusão. Semáforo. LUZ AMARELA. Os veículos param. O trabalhador caminha no
corredor formado entre os carros.
“ Amendoim! ”, “ Amendoim! ”, “ Amendoim!
”.
O trabalhador nota
o passageiro do dia um. O passageiro do dia um está novamente no passageiro.
Outro veículo.
- Boa noite. –
Fala do trabalhador diretamente para o passageiro. – Vai levar?
O passageiro
guarda o celular. O passageiro, novamente, sem pronunciar uma palavra faz que
não com a cabeça.
O trabalhador curva
o torso. O trabalhador aproxima-se do veículo com a mesma intimidade do dia
anterior.
- E o parceirinho,
vai? – Fala do trabalhador para o condutor do veículo. – Opa! Desculpa. – O
condutor é outro. O condutor não é o mesmo do dia um. – Perdão.
Os veículos partem.
Dia três. Erro.
Veículos parados no trânsito. Semáforo. Ponto de trabalho do trabalhador.
“ Amendoim! ”, “ Amendoim! ”, “ Amendoim!
”.
- Salve, parça!
Condutor um.
Volume médio. Sozinho. O condutor um desce o vidro do veículo, lado esquerdo,
lado do motorista. O trabalhador continua a fala.
- Beleza? Passou
ontem por aqui o passageiro um, no passageiro. Outro carro. Outro condutor.
O condutor um trava
o sorriso. O condutor um abaixa o volume, tira o som. O condutor um está mudo.
Semáforo. LUZ
VERDE. Um, dois, três, quatro, cinco segundos, buzinas.
- Abriu, parça! Abriu. – O trabalhador chama
atenção do condutor um.
O condutor um tem
os olhos cheios d’água. Mais buzinas. O trabalhador aproxima-se do veículo. O
trabalhador abre a porta do motorista.
- Brow. Ei, brow. Cai pro lado.
O condutor um esparrama-se
para o passageiro. O trabalhador abre a mala do veículo. O trabalhador exige
calma dos outros condutores. O trabalhador põe na mala um forno a carvão feito
latão de tinta dezoito litros. O trabalhador assume a direção.
Gratidão.