quarta-feira, 13 de julho de 2016

Não me odeiem

- É como seguir reinventando o mundo.

- É? Como? Não vejo.

- Escrevo um pouco por vez.

- Alô.

- Quem é?

- Está bem. Beijo. Minha mãe. Disse que fez parmegiana.

Eu quando acordo minha mãe já não está.

Se você gostar a casa é nossa. Ou podemos pensar outro lugar. Um lugar para viver. Mais que um lugar para morar.

Podemos ter os nossos filhos.

Não moro mais na Santa. Mudei de Rua. Bem, você sabe.

- É “ Apenas mais uma de amor ”.

Foi o que acabou de tocar na rádio.
Essa você nunca mandou.

Mas é daquelas que canto repetidas vezes em algum momento do dia. Lulu é um porre (o Lulu).
Você mandou da Gal e, meu deus, a Gal é mesmo maravilhosa.

Não me odeie.

É só mais um texto. Escrevo para ser escritor. Talvez você pense que.

Mas não é para você. Até é. Literatura. Tem coisas nossas também. Mas não é somente você.

Não me odeiem.

Não desejo isso de vocês.

Não creio que exista alguém que deseje.  

Enquanto isso:

Na palestra de merda um.

Perdão. Não é pessoal com o palestrante.

Texto cento e vinte e, não importa.

É a maneira como faço anotações das falas.

Diz o palestrante que:

Há trabalho. Só depende do como a arte vai ser. Ela fala o que? A indústria quer!

1 – Vender

E você – eu – nesse momento pareceu o olhar dele – do palestrante – dirigido a mim, me dizendo – quer comprar uma bota preta tipo Chico Bento; fazer mais uma tatuagem no braço esquerdo; até casar, você quer. Coisas que estão em alta no seu tempo. Então, pense:

Funciona assim: a indústria quer:

2        – Qualquer coisa que venda.

Pensei:
Meus textos? Não. Não vendem. Não são para vender. São? A arte não é isso.

Ele sentado em uma confortável poltrona de couro preto. Ele com as pernas cruzadas.

Mesmo que seja um material sobre ou para:

1 – Envergonhar a elite com os absurdos que ela reproduz sem fazer ideia das grandes bobagens que anda por aí dizendo, fazendo ou escrevendo.

2 – Como?

Seu personagem deve / pode ser irônico. Ou ter um diálogo duplo. Sendo o primeiro, a fala e, o pensamento, o segundo.

Exemplo:

“Bom dia [e], vai se foder (em itálico). ”.

- Gosto. Vejo a forma. Legal. Mas não me interessa a forma. Quero o conteúdo. Quero que me conte de você. Tem que trazer o conteúdo para forma que é boa, mas, não é o que importa.
- Ela voltou.
- Que?
- Ela voltou e está na minha cabeça o tempo inteiro.
- Eu sabia que era isso. Eu sabia.

Foi isso.

Um.

Encontro.

Deu uma bagunça.

Com.

Ela.

E eu.

Escrevo.

Maneiras de dizer.

Ficou confuso. Não sei o que vai ser.

Por hora, fim.

Do exercício quarto. Do vocacional de literatura. Poesia. São Paulo. Centro.

domingo, 3 de julho de 2016

A-MA-RE-LO

A-MA-RE-LO        


Falávamos das coisas da cidade. De uma cidade com:

- Pão, carne, salada, peixe.  

Em recortes.

- Que mais?
- Goiabada, bolacha ou biscoito e café preto.
- Que delícia.
- Mas se falta?

Dor.

- Não falta.
- Num gosto nem de pensar num troço desses.
- Nem de brincar.
- Nem mesmo.
- Eu gosto é de pensar que tem.
- Vocês me ouviram?

Batata, linguiça e couve manteiga.

- Tem!

Na bancada.

Tem alimento que é imagem, alimento com os olhos, tem também quem, alimento com o cheiro. Alimentos como podem.
Tem quem não perca tempo e se afasta e, volta com as panelas, a tábua de madeira, as facas de corte.

- São da cidade?

Todos eles cortam os ingredientes da venda que segue aberta até que passe o último trem. Até a chegada do último morador que precise de álcool, papel higiênico ou detergente.

- Daqui mesmo.
- Vamos sair mais tarde?
- Nesse frio!?
- Quem aguenta?

Ninguém.

Calados. Refletem. Tantas coisas. Mas têm um teto.

- Está bom para ficar de chamego.
- Está mesmo.
- Vamos comer primeiro.

Sentam, conversam.

- Pra lá, que será que pensam?
- Não sei.
- Que nos aguentem.
- Claro!
- Pensam ser uma grandeza!
- Temos parte também.

Manhã, tarde ou noite, na madrugada.

Barulho. Barulho.  

Tem de acontecer. Vez ou outra acontece. Bate na janela um dos pés ou uma das mãos. Na hora do trabalho todo apoio, necessário.

- Meu deus!, pintaram o prédio inteiro!

Pois isso, é só um terço. 

terça-feira, 14 de junho de 2016

Meu Chapeuzinho é um carro também vermelho

- indo.
- Pega o documento.
- Não. Já estou descendo.
- Não vai sem o documento.

Já era hora.

- Não vai dar tempo. Beijo! – Fechando a porta.

Ignição. Luz amarela – reserva.

“Não vai dar tempo ”.

Dez minutos mais.

- Por favor, abastece vinte, álcool.
- A chave!

Desço.

- Reais.

Giroflex ligado parado na porta da conveniência.

“O documento! Merda ”.

Não olho.
Olho.

“Não vai dar tempo ”.

Giroflex. Troca de olhares. Dez litros no tanque com planos para ir e voltar - ir e voltar quantas vezes achar necessário, no mínimo três.

- Sr., a chave.
- Valeu!
- Débito ou crédito?
- Dinheiro.

Menos dez minutos. Menos um viaduto dos quatro até ao centro.

- Esse que acabou de sair, quanto foi que abasteceu?
- Qual?
- Do carro vermelho.
- Vinte.
- O que?
- Reais.
- Ele é daqui?
- Não sei.
- Primeira vez dele?
- Não. Vem sempre.
- Que mais que sabe me dizer?

Parada. Trânsito. Giroflex no local de sempre – em cima do canteiro entre vias –, atentos. No carro: vidros abertos, luz interna acesa e o celular que toca e vibra, vibra e toca. Viva-voz.

- Oi.
- Pegou o documento?
- Não deu tempo. Agora não dá para falar. Depois te ligo.

Um, dois, três, quatro cruzamentos, vire à direita, vire à esquerda, uma vaga. Para. Giroflex na porta do trabalho.

- Ei, rapaz, trabalha aí?

Afirmativa com a cabeça.

- Sim. Aconteceu alguma coisa?
- Apenas averiguando. Tem documento?
- Como?
- R.G.
- R.G.? Tenho. Só preciso deixar umas coisas lá dentro.
- É? O que?
- Só alguns textos.
- Que tipo de textos?
- Só alguns poemas.
- É? E você publica?
- Sim.
- Assina como? Só pra saber.

Edu Xavier Filho – 2 mil e 16.